
Epistemologias e Saberes Indígenas
ARTIGO
Uma reflexão sobre os saberes indígenas e seu crescente protagonismo na literatura, cinema e academia como forma legítima de ciência e resistência.
Dialogar com os saberes e as epistemes dos povos indígenas continua sendo um desafio para a sociedade não indígena, sobretudo nos espaços educacionais, onde ainda predominam conhecimentos ocidentalizados — herança do colonialismo e de cânones consagrados da ciência europeia. Nesse contexto, é fundamental reconhecer que as epistemologias indígenas constituem um processo de desconstrução de teorias que tendem a marginalizar saberes originários, vítimas de um epistemicídio cultural promovido pelo pensamento ocidental e cientificista.
Hoje, destaca-se a importância da produção de conhecimento pelas próprias comunidades indígenas. Suas contribuições se fazem presentes na literatura, na Sociologia e na História, buscando protagonismo e reconhecimento científico para saberes que sempre existiram como formas legítimas de ciência, mas foram ofuscados pela hegemonia eurocêntrica. Esse protagonismo, no entanto, enfrenta conflitos com os cânones estabelecidos pela modernidade.
Quando falamos de autoria indígena no Brasil, referimo-nos a um amplo movimento que rompe com constructos coloniais e ressignifica o indigenismo como ação política concreta. Esse movimento manifesta-se em três frentes principais:
Produção literária indígena — especialmente na literatura infantil e em publicações bilíngues de escolas e projetos de educação indígena;
Produção cinematográfica — por meio de iniciativas como o Projeto Vídeo nas Aldeias, o box “Cineastas Indígenas” e o Festival Vídeo Índio Brasil;
Produção acadêmica — com a crescente inserção de pesquisadores indígenas em cursos de graduação, mestrado e doutorado, em diversas áreas do conhecimento.
A teoria produzida por autoras e autores indígenas permite debater o existir, o resistir e o reexistir, respeitando o meio em que vivemos. Ressignificar a história indígena (e brasileira) com novas interpretações vai além da “reparação histórica”: aprofunda o sentido de participação na construção da nação, apontando para um protagonismo contra-hegemônico que reforça a sobrevivência e a força dos coletivos populares.
Trazer esses saberes para a sala de aula é essencial para desmantelar preferências cristalizadas pela produção acadêmica ocidental. Trata-se de superar categorizações entre “conhecimento científico” e “não-científico” e abrir diálogo entre ciência e epistemologias diversas.
Ao valorizar o pensamento indígena — suas cosmologias, práticas de saúde, sistemas de educação e técnicas de manejo ambiental — demonstramos a riqueza e a diversidade que os povos Kamakã-Mongoió, Imboré e Pataxó transmitem por gerações, sobretudo pela oralidade. Incorporar esses saberes ao currículo escolar é, portanto, um passo vital para reconhecer a contribuição indígena à sociedade, em múltiplos campos do saber e da vida cotidiana.
Referências:
AGUIAR. Edinalva Padre. (org) Revista Memória Conquistense edição nº 5: “Ymboré, Pataxó, Kamakã: A presença indígena no Planalto da Conquista”, (2000) produzida pelo Museu Regional, a partir dos escritos de Edinalva Padre Aguiar, Antonieta Miguel e Ruy Hermann Medeiros.
ISA-INSTITUTO SÓCIO AMBIENTAL -
https://pib.socioambiental.org/pt/P%C3%A1gina_principal
NEWIED. Maximiliano Wied “Viagem ao Brasil” do Príncipe Maximiliano Wied Newied (1815-1817)
OLIVEIRA. Renata Ferreira de (2020), “Índios Paneleiros do Planalto da Conquista: do massacre e o (quase) extermínio aos dias atuais” (2020)
OLIVEIRA. Renata Ferreira de. Batalha: Memória e Identidade Indígena no Planalto da Conquista. Monografia de finalização de curso, UESB, Vitória da Conquista, 2009.
SPIX. Von MARTIUS. Von “Através da Bahia”: Terceira edição, 1938 Companhia Editora Nacional São Paulo - Rio - Recife - Porto Alegre
SOUSA. Maria Aparecida Silva de. “A Conquista do Sertão da Ressaca: povoamento e posse da terra no interior da Bahia”, (2001)
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Memória Indígena de Vitória da Conquista e Região é uma plataforma de pesquisa e acervo dedicado à história, cultura e depoimentos dos povos Kamakã-Mongoió, Pataxó e Ymboré.
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